2.1. Curvas de crescimento da erva, em sequeiro
Com a distribuição anual da chuva e da temperatura na região conforme Fig. 1.10, é natural que o ciclo vegetativo das herbáceas, forrageiras ou não, esteja condicionado por esses valores. Nomeadamente pela pluviosidade, atendendo a que a maioria destes solos, como regra, não retêm humidade suficiente para o normal desenvolvimento das herbáceas para além dos 25-30 dias sem chuvas. Período que poderá ser menos afectante no inverno.
Como também se realçou na mesma Figura, os dois períodos mais favoráveis ao desenvolvimento herbáceo acontecem no outono e na primavera, mas aos quais não correspondem picos de igual produção de erva, por esta se encontrar em fases vegetativas diferentes.
No período do outono as plantas estão em início de crescimento (de germinação ou de rebentação), com um lag-time também de 25-30 dias entre o começo das primeiras chuvas efectivas e a disponibilidade efectiva da primeira erva para pastoreio. No período da primavera estão totalmente enraizadas (e afilhadas, se for caso disso!) e em pleno desenvolvimento vegetativo e reprodutivo. A taxa de formação de biomassa bruta primaveril é bem maior, só constrangida pela possível falta de humidade no solo (falta de chuvas), afectando a finalização do seu ciclo.
São estes dois picos de produção desigual, separados por uma paragem ou por um menor crescimento no período invernal, que tipificam o crescimento da erva no clima mediterrâneo em geral e no Alentejo em particular e a que se chama Curva de produção ou de crescimento da erva. Explicite-se, porém, o significado destas curvas.
A representação gráfica de uma curva de produção de erva, por amostragem, corresponde sempre a um de dois modos de cálculo: ou é a curva representativa do crescimento normal das espécies sem quaisquer pastoreios, traduzindo os crescimentos periódicos cumulativos desde o início do ciclo, ou é a curva representativa de crescimentos periódicos, após cada corte, traduzindo os crescimentos de cada rebentação. Ou pode ser uma curva mista dos dois modos de cálculo, consoante as épocas.
As do primeiro tipo, que são todas as que aqui se representam, constroem-se fazendo cortes periódicos (mensais, p. ex.) sempre em locais diferentes, na mesma folha e na ausência de pastoreio. As do segundo tipo, constroem-se fazendo cortes periódicos sempre no mesmo local, na ausência de pastoreio ou com pastoreio mas protegendo o local com caixa de rede ou mini parque. As datas de corte, neste último caso, determinam-se, ou por uma altura média da erva, pré definida (10 cm, p. ex.), ou por coincidência com ciclos de pastoreio que estejam a acontecer nessa pastagem.
As curvas do primeiro tipo são teoricamente mais constantes, espelhando melhor o clima, a composição florística e a evolução da degradação nutritiva da pastagem em causa. As do segundo tipo são mais reais mas também mais variáveis, dado pretenderem reflectir a actividade perturbadora dos pastoreios no crescimento e qualidade da erva.
Em ambos os casos, nenhuma consegue representar, com exactidão, o crescimento efectivo de uma pastagem com animais em pastoreio. Faltam sempre os efeitos das diferentes interacções animal-pastagem, nomeadamente selectividade, pisoteio e excreções, sobre cada espécie pratense em crescimento ou recrescimento (rebentação).
Mesmo empiricamente, nota-se que as taxas de recrescimento de uma pastagem sujeita a cortes mecânicos radicais e periódicos são diferentes das de uma pastagem sujeita a cortes pelo animal parciais, aleatórios e intermitentes. Calcular essas diferenças e generalizá-las para cada pastagem, animal e tipo de pastoreio é tarefa muito difícil. O modo de pastoreio é o mais afectante destas diferenças.
Por isso, convém também distinguir as curvas de produção bruta amostradas no mesmo local ou em locais diferentes, das curvas de produção real ou efectiva. Estas pretendem traduzir a produção de erva que vai ser realmente ingerida pelos animais. São curvas mais difíceis de traçar, aparecendo mais circunscritas a trabalhos científicos específicos. São, normalmente, curvas parciais, referentes a um período do ciclo anual da erva.
As diferenças entre estas duas últimas classes de curvas serão tanto maiores quanto mais heterogénea ou de pior qualidade for a pastagem. É o caso das curvas de produção bruta cumulativa obtidas de pastagens naturais infestada por muitas “más ervas”. Podem mostrar valores anuais relativamente elevados mas correspondendo a valores reais bem mais baixos. E esta grande diferença origina-se, sobretudo, no período de primavera-verão.
As curvas mais próximas das reais são as construídas em pastagens com poucas espécies e sujeitas a pastoreios racionais apertados. Por cortes à entrada e à saída dos animais de cada parque, pode-se avaliar com rigor, para cada período, o crescimento desta, correspondendo essa biomassa ao ingerido pelo rebanho. São curvas mais conseguidas em pastagens de regadio.
No Alentejo, e independentemente do tipo ou classe de curva, o pico da primavera é sempre o mais acentuado não só pelo clima como pela fase vegetativa das espécies, como se referiu. E para além de mais acentuado é também o mais previsível na curva, para este clima. É o mais previsível não na quantidade absoluta mas na quantidade relativa à produção total. O mais imprevisível é esta produção total anual.
Assim, para estas pastagens de sequeiro, e dada a variabilidade de precipitações, resulta que o mais provável é haver todos os anos uma curva de valor diferente, embora com a mesma semelhança gráfica. Será, por isso, pouco importante mostrar-se a curva de produção que aconteceu num certo ano, não se sabendo quando se repetirá. É mais relevante, neste clima, analisarem-se as curvas médias para anos pluviométricos típicos nas duas mais influentes estações do ano (outono e primavera).
São essas curvas que, para simplificação pedagógica, se representam nas Figs. 2.1 a 2.4, correspondendo a situações climáticas tipo, bem compreendidas e sentidas na prática. São curvas de crescimento bruto cumulativo em pastagem natural, típicas de anos com mais ou menos chuvas no outono (Set.-Out.-Nov.) e/ou na primavera (Abr.-Mai.-Jun.), as mais determinantes da repartição e da produção total de erva.
As chuvas invernais, pela sua mais provável suficiência mas em período frio e de curta luminosidade, determinam menos a produção, pelo que não foram aqui consideradas. Só nalguns anos de invernos amenos e chuvosos elas influenciam bastante a produção pratense.
Abstraindo também do parâmetro temperaturas, vejam-se então as configurações que poderão ter estas curvas ao longo do ano pascícola (Set.-Ago.), quando representadas pelos crescimentos médios mensais, nas 4 seguintes situações pluvimétricas tipo:
- Curva H-H: ano de outono Húmido (>200 l/m2) e primavera Húmida (>150 l/m2)
- Curva H-S: ano de outono Húmido e primavera Seca
- Curva S-H: ano de outono Seco e primavera Húmida
- Curva S-S: ano de outono Seco e primavera Seca
A curva H-H, a mais desejável mas também a mais rara – não se registou este regime de chuvas em Évora(Mitra) no decénio 1994/2004 – é obviamente a mais produtiva caso não coincida com inverno seco. As espécies poderão estar cerca de 9 meses em actividade, nomeadamente as vivazes, o que se traduz por uma produção de biomassa bruta da ordem das 3 t MS/ha, mais ou menos aproveitáveis consoante a flora, a espécie e carga animal e o sistema de pastoreio que se estiver a praticar.
A curva H-S é típica de um regime de chuvas que aconteceram 4 vezes em Évora (Mitra) no último decénio (3 vezes nos últimos 4 anos). É a curva de secagem repentina da erva primaveril quando está em fase de grande crescimento. A produção das leguminosas é a mais afectada e as espécies anuais mais tardias podem não assegurar suficiente produção de sementes. As perspectivas de reservas para agostadouros baixam. É, ainda assim, um ano de “boa pastagem”, com produções brutas, em média, acima das 2 t MS/ha, devido ao bom outono com influência positiva no crescimento invernal.
Como se referiu, este regime de chuvas até foi frequente nos últimos 5 anos mas, certamente, por mera casualidade. O estreitamento do período de chuvas, com estas a cair mais cedo e mais intensamente são questões que estão na ordem do dia, quando se investigam alterações climáticas no mediterrâneo.
Mas segundo Goodess (19), a variabilidade dos dados existentes não tem permitido ainda definir tendências consistentes, nem neste nem noutro sentido. A seca severa do ano 2004/2005, veio dificultar mais estas previsões, a que os meteorologistas clamam como sendo anomalias e não alterações.
A curva do tipo S-H, cujas chuvas só aconteceram 2 vezes em Évora (Mitra) neste último decénio, é menos produtiva do que a anterior devido à escassez de humidade na fase de implantação das anuais e de início das vivazes. As pastagens destes anos, iniciando o seu ciclo mais tarde chegam ao inverno mais jovens e menos bem enraizadas, sofrendo mais com o frio e produzindo menos nesse período.
Chegada a primavera, as espécies mais precoces, incluindo muitas das piores infestantes, já pouco beneficiam dessa humidade suficiente, tentando, as de ciclo longo, como que recuperar do constrangimento a que foram sujeitas até aí. As leguminosas, quando existem, serão as menos afectadas.
Devido a haver menos erva ao longo de todo o outono-inverno, são anos mais preocupantes para o agricultor que os do regime anterior. Apesar da pouca diferença de produção da dos outonos húmidos, ela resulta ainda mais concentrada na primavera, dificultando mais a sua gestão. Como mais valia teremos os maiores excedentes que poderão “transitar” para o verão, como pasto seco.
Finalmente a curva do tipo S-S, a pior em termos de pastagens, verificou-se 3 vezes em Évora (Mitra) nesta década, não incluindo o ultra seco ano de 2004/05. É o temível ano de poucas chuvas, mais ou menos atenuado pelas maiores ou menores chuvas invernais. O período de erva verde desta curva não vai além dos 6-7 meses e com taxas de crescimento quase sempre insuficientes para manter o encabeçamento normal. Só no curto período de fim do inverno-início da primavera é que se pode esperar ter erva suficiente para os efectivos. Os pastos secos estivais quase não irão existir, dado que a pouca biomassa formada é ingerida logo em verde.
É a curva de 1,5 t MS/ha de biomassa bruta, mas com mais elevada taxa de aproveitamento (≥80%) devido à escassez de erva e à sua menor fibrocidade nestes anos. São anos de produções muito abaixo das necessidades dos encabeçamentos normais da região, exigindo dispendiosos complementos dietéticos (fibrosos e concentrados) ao longo de vários meses do ano.
Veja-se agora, separadamente, como tendem a ser as curvas de produção só das duas espécies mais importantes das pastagens (gramíneas e leguminosas), para um ano de clima normal (Fig. 2. 5). Aí se observa o “peso” das gramíneas no pico outonal da erva prolongando-se pelo inverno e o “peso” das leguminosas muito circunscrito ao grande pico primaveril com algum prolongamento pelo verão. As razões ligam-se às exigências climáticas (térmica e luminosa) destas últimas.
Assim, só na primavera as leguminosas entram maioritariamente na composição da biomassa destas pastagens, dominando-as mesmo, caso existam em população elevada, não sejam ensombradas por outras mais altas e disponham de suficiente humidade no solo. Por isso, as primaveras húmidas ou secas têm tanto maior impacto na produção herbácea total quanto mais rica em leguminosas for a pastagem.
Ou seja, em geral a máxima produtividade das gramíneas obtêm-se nos anos de outono/inverno húmidos enquanto que a das leguminosas se obtem mais nos anos de primaveras húmidas.
Voltando à curva de clima normal em pastagens polifíticas apresenta-se, na Figura 2.6, a curva de 2,5 t MS/ha, para uma pastagem de composição florística comum na zona de Évora (30%Gram. x 30%Leg. x 40%Outras) e a curva pluviométrica de 664 l/m2 (média de 30 anos), para esta mesma zona.
Elas evidenciam, outra já esperada desarmonia neste clima, entre o(s) pico(s) da chuva e o maior pico da erva devido, à já referida limitação dos factores temperatura e foto período no desenvolvimento herbáceo. Caso a chuva se destinasse exclusivamente ao estrato herbáceo, o que não é verdade, seria manifesta a sua baixa eficácia invernal face à taxa de crescimento deste.
Sobre a própria curva de produção bruta temos, como já era evidente pelas figuras anteriores, uma repartição bem desigual nos cerca de 9 meses de erva verde. Assim, na primeira metade produz-se menos de 30% da produção total, formando-se os restantes mais de 70% na segunda metade do ano. E se se pensar no diferente crescimento entre gramíneas e leguminosas, atrás referido, então esta repartição será ainda mais desigual no caso destas últimas.
Em termos de taxas médias de formação de MS, teremos estas pastagens a produzirem cerca de 5 kg MS, ha-1, dia-1 até Fevereiro, passando depois para cerca de 15 kg ha-1,dia-1 até Junho. O resultado é que se as dificuldades da gestão pascícola são já bastantes em termos de programação antecipada, pela imprevisibilidade do clima, elas são ainda acrescidas ao longo do ano por esta enorme desigualdade produtiva face à muito constante procura por parte dos efectivos.
É, assim, na debilidade produtiva da primeira metade do ano que continua a residir todo o interesse das gramíneas no melhoramento das pastagens mediterrâneas. É bem sabido que as altas produções pratenses das zonas de clima atlântico são devidas às dominantes gramíneas vivazes da sua flora (+ azoto) e não às leguminosas. A estas, só mais recentemente se lhes começou a dar alguma importância nestas zonas e muito por razões ambientais.
A Figura 2.8 mostra uma curva de uma pastagem inglesa (12) à base de gramíneas, construída a partir de crescimentos com cortes de 4 em 4 semanas e referente ao período de maior actividade vegetativa desse país: Abril a Outubro.
Realce-se que é uma curva de 9 t MO (cerca de 10 t MS), em regime de chuvas naturais e ao longo de 7 meses, somente, já que no período invernal britânico o crescimento da erva é praticamente nulo. É uma produção de mais do triplo da da curva média mediterrânica, para semelhante quantidade de chuvas (680 l/m2, em Reading) (51) mas bem melhor distribuídas.
Na Figura 2.7 mostra-se ainda a mesma curva de produção média de 2.500 kg, mas ao longo do ano civil (Jan. - Dez.). Aí se destaca o excedente de erva que se vai acumulando ao longo da primavera, rejeitada pelos animais por excesso de fibra, por má palatabilidade ou por não necessidade desta. Este excedente, variável consoante o ano pluviométrico, vai constituir o pasto seco do período estival, de maior ou menor valor nutritivo (mas sempre baixo), consoante tenha sido objecto de menor ou maior escolha animal na Primavera.
2.2. Curva de crescimento da erva em regadio
As pastagens temporárias de regadio no Alentejo têm muito pouca expressão actualmente. Algumas das implantadas, foram sendo preteridas pela dupla de forragens anuais de pastoreio e corte (ou só corte!), uma de ciclo outono-inverno e outra de ciclo primavera-verão.
Apesar dos maiores custos financeiros de produção, a biomassa bruta produzida pela dupla Azevém anual (com leguminosas) + Milho forragem, na mesma área ou em áreas diferentes, rapidamente se impôs nas poucas explorações pecuária intensiva da região. Tem sido o caso das mais recentes explorações de bovinos de leite.
Para além das maiores produções de biomassa com duas forragens anuais, também a possibilidade de compra do milho para ensilar (adquirido dentro ou fora do Alentejo), tem contribuído para a não opção pelas pastagens temporárias regadas. Segundo opiniões pessoais de empresários de produção de leite, aquelas permitem maiores produções animais por hectare, aliadas a um mais fácil maneio dos animais, com mais tempo de estabulação e menos de pastoreio (menos gastos energéticos). A isto se alia ainda uma mais fácil elaboração e distribuição de dietas completas, de um modo uniforme e mecanizado.
Mas estas razões não são, sequer, só da produção leiteira alentejana, elas são as mesmas ou semelhantes em todo o país, ou em qualquer local onde a cultura do milho é economicamente viável.
Apesar de tudo, vale a pena fazer breves referências às pastagens de regadio nesta região, mostrando-se taxas de crescimento e espécies mais utilizadas nestes prados, originando a característica curva anual de produção, nada comparável às de sequeiro. São pastagens que, apesar das alternativas atrás referidas, permitem produções e consequentes níveis de encabeçamento, superiores aos das pastagens de clima atlântico, só que mais dispendiosas devido à rega.
O longo período quente e seco alentejano é, de resto, a maior dificuldade que estes prados enfrentam em termos da sua viabilidade económica. As dotações de água de rega têm de ser elevadas e persistentes ao longo do verão, traduzíveis em moderados crescimentos das gramíneas temperadas, por excesso de calor. A persistente indução floral e alguma dormência estival são muito difíceis de contrariar nas gramíneas vivazes destes prados. E elas são aqui fundamentais!
Basear estas pastagens só em leguminosas, significaria concentrar ainda mais a produção no período estival e ter menos pastagem nos extremos da curva de produção, situações que mais dificultariam a gestão desta erva. Também a mais valia de fertilidade trazida pelas leguminosas não era eficientemente aproveitada por falta de gramíneas.
São prados que, neste clima, necessitam formar com rapidez densos tapetes de toiças de gramíneas interligadas por teias de leguminosas, para persistirem sem se deixarem infestar por espontâneas de baixa qualidade que vêm, todos anos, do outono-inverno. E em especial nos primeiros anos de implantação do prado, quando a MO é ainda baixa.
A manutenção destes “relvados” só se consegue, neste clima, com elevadas dotações de água de rega estival e pastoreios adequados. As dotações totais destas regas, que variam com o solo, com as espécies e com o ano pluviométrico, podem representar mais de 150% das chuvas naturais. São, assim, prados em que os custos do sistema de rega e da própria água, face aos preços conjunturais dos produtos animais que aí se produzem, costumam determinar a sua viabilidade económica. Determinam no Alentejo ou em qualquer outra região!
Sobre as espécies vivazes a explorar nestes prados, e dados os elevados índices térmicos da região, as maiores produções conseguem-se quando se podem privilegiar as Festucas altas (Festuca arundinácea) sem dormência estival, no grupo das gramíneas e as Luzernas (Medicago sativa) no grupo das leguminosas, (em solos fundos e de pH ≥ 6,0).
Para além das Festucas, a Falares e o Panasco (Phalaris tuberosa e Dactylis glomerata) podem e devem englobar o lote das gramíneas. O Azevém perene (Lolium perenne), pela sua maior afectação estival, é o menos recomendável para estes prados, apesar do seu bom desempenho invernal.
No lote das leguminosas, são o Trevo branco e o Trevo morango (Trifolium repens e T. fragiferum), pelas suas características de rápida disseminação entre as gramíneas e menores exigências pedológicas, os mais comuns em todos os locais onde a Luzerna não tem condições, e que são a maioria no Alentejo.
Sejam os trevos seja a luzerna eles são fundamentais no equilíbrio produtivo e nutritivo destes prados, para além do “apport” azotado que trazem por via da simbiose que desenvolvem com bactérias do género Rhizobium. Este azoto é mesmo um dos principais factores de economia destes prados, face ao sistema das duas culturas anuais, que atrás referimos, baseado quase só em gramíneas+azoto de síntese.
Dentro destas clássicas espécies para prados de regadio é preciso atender-se sempre, às diferentes variedades que existem ou vão aparecendo no mercado e que aqui não se referem. Ciclos vegetativos, dormências invernais e estivais, induções florais, resistências a pragas e doenças, etc., são algumas características que definem comportamentos varietais a ter em conta na escolha das sementes para cada prado. Algumas variedades, pela sua dominante e constante presença no mercado, sobrepuseram-se mesmo, em conhecimento, à espécie que lhe deu origem.
A produção bruta destes prados, muito próxima da real situa-se, genericamente, entre as 12 e as 16 t MS/ha/ano, consoante o solo, as espécies, o inverno, as regas e o pastoreio. Mais de 90% desta erva produz-se no período de Fevereiro a Novembro, segundo uma curva de crescimento do tipo expresso na Figura 2.9.
Os menores crescimentos de Dezembro a Fevereiro – bem maiores, ainda assim, que os de clima atlântico – são, nos invernos muito chuvosos, de difícil ou impossível utilização. O excesso de água, mais do que constrangir os crescimentos, impede os pastoreios, pois os efeitos negativos do pisoteio são enormes para o prado.
Estas forçadas paragens de pastoreio invernal são propícias a uma maior infestação destes prados pelas já referidas infestantes autóctones de baixo valor forrageiro. Mas isto revela-se mais em prados ainda novos ou mal atapetados. É nestes casos que se recomenda o recomeço do pastoreio pós-inverno, o mais cedo possível, memo que seja só em pastoreios rápidos, ditos de limpeza.
Os ligeiros decréscimos de produção de Julho e Agosto serão mais ou menos acentuados consoante as gramíneas do prado tenham características mais ou menos dormentes ou a diferenciação floral seja muito forte, nas espécies em geral. Mas para além destes decréscimos de origem biológica, podem também acontecer decréscimos por involuntárias limitações hídricas, devido à elevada evapotranspiração neste período. As frequências de rega e respectivas dotações de água têm de estar bem de acordo com o tipo de solo onde o prado está instalado.
Em comparação com a curva média das pastagens de sequeiro (Fig. 2.10), ressalta bem como o efeito da rega estival permite mais que quadruplicar a produção herbácea, com espécies vivazes, obviamente. A consequência pecuária desta produção é que ela permite, logicamente, acréscimos de encabeçamentos na mesma ordem de grandeza e com dietas nutritivamente mais regulares, ao longo do ano.
Exceptuando as limitações invernais, estes prados permitem cerca de 300 dias anuais de pleno pastoreio, com uma taxa média de formação de fitomassa bruta de cerca de 40 kg MS/ha/dia (crescimento diário da erva), alimento suficiente para cerca de 3 bovinos adultos (3 CN) e da forma mais económica que é o pastoreio directo.
Em suma, apesar das enormes potencialidades destes prados face às pastagens de sequeiro, eles não só não têm expressão actualmente na região como, segundo prevemos, não irão constituir, para já, prioridade para as novas áreas de regadio, de que o Alentejo vai dispor a curto e médio prazo (Alqueva).
Convém sempre recordar que as pastagens são um produto intermédio da fileira pecuária, totalmente influenciável pelos preços de mercado dos produtos animais finais. E se a produção de leite não tem seguido a via das pastagens, pelas mesmas razões a produção mais intensiva de carne poderá também seguir a via das forragens de corte como complemento das pastagens de sequeiro. Os acabamentos, quando os houver, serão já em estabulação com dietas de forragens + concentrados.
2.3. Evolução químico-digestiva das pastagens de sequeiro.
(curvas de qualidade nutritiva)
Sobre as variações (decréscimos) de qualidade das pastagens no Alentejo, ao longo do ano, elas são conhecidas e sentidas por técnicos e agricultores, embora nem sempre se lhe dê a devida importância nutritiva. As preocupações de falta de quantidade suplantam, em muitas épocas e em muitos anos, as de falta de qualidade.
Também por todos é pressentido que os decréscimos de qualidade não são lineares ao longo do ciclo anual, já que as evoluções fisiológicas e morfológicas nas espécies se processam a ritmos diferentes consoante as condições ambientais (climáticas) e em timings diferentes consoante as diferentes espécies florísticas.
Assim, pode-se traçar, p. ex., a curva da evolução da taxa de digestibilidade de uma pastagem de sequeiro num determinado ano, mas ela dificilmente é extrapolável para anos seguintes, devido à imprevisibilidade climática, implicando ou não variabilidade florística. Esta variabilidade tende, obviamente, a ser maior nas pastagens naturais polifíticas do que nas pastagens melhoradas, já com menos espécies.
Tal como se referiu para as curvas de quantidade, também as curvas de qualidade mais fáceis de traçar são as reportadas a valores de amostras recolhidas mecanicamente e sempre em sítios diferentes, não pastoreados. Elas medem a evolução qualitativa da erva intacta ao longo do ano. São só estas que vamos aqui, genericamente, mostrar, para se ter uma ideia da dinâmica degradativa das herbáceas, neste clima.
E também como na quantidade, as curvas de qualidade de amostras colhidas no memo local (erva de recrescimento) representarão mais a realidade da erva ingerida, com mais ou menos precisão conforme as espécies e a riqueza florística das pastagens, originarem menos ou mais selectividade de pastoreio. Elas representam muito bem a qualidade das dietas quando em pastagens de regadio com pastoreio rotacional.
As curvas sobre análise de amostras colhidas efectivamente pelo animal, as mais reais, são bem mais complexas e difíceis de obter, pelo que, quando se tentam traçar, se reportam a estudos de ingestão e nutrição muito concretos. È toda uma área de estudos utilizando “marcadores” (elementos químicos ou fracções inalteráveis no trânsito digestivo) internos ou externos à erva, ou animais fistulados, quando autorizados. São assuntos fora do âmbito deste trabalho, pelo que ficamos pela sua notícia.
Quando se pretende avançar para curvas mais consequentes do valor quantitativo e qualitativo da erva, e mais fáceis de obter, passa-se logo para curvas de performance animal, que traduzem os resultados económicos daqueles valores (sejam curvas de produção de leite sejam curvas de acréscimos de peso vivo). Mas também destas, não vamos aqui tratar.

As variações anuais do clima podem influenciar, não as tendências gerais destas curvas, mas os slopes em algumas épocas, pelo apressar ou retardar do ritmo de maturação das diferentes espécies.
Observando este evoluir da valorização química e digestiva ao longo do ano pascícola, ressaltam as menores variações de qualidade entre Novembro e Março (fases de pré-floração) e as maiores variações entre Abril e Julho (fases de floração/frutificação), com destaque para os grandes decréscimos da MSD e da PB, as fracções nutritivamente mais importantes.
Temos, então, cerca de 6 meses com pouco decréscimo de qualidade, seguidos por cerca de 4 meses com grande degradação. Infelizmente o primeiro período coincide com a pouca disponibilidade de erva e o segundo com o pico de máxima produção (Fig. 2.6).
Consoante a maior precocidade das espécies e a menor humidade nos solos, assim a transição do primeiro para o segundo período acontecerá mais cedo e mais repentina. Ou seja, quantidade e qualidade muito rapidamente se dissociam nas pastagens mediterrâneas (alentejanas).
Na primeira fase da erva, os valores químico-digestivos são sempre acima dos valores médios de uma qualquer pastagem mista de gramíneas e leguminosas (12-14% PB e 60-65% MSD) (27), originando taxas de ingestão diárias >20 gr MS/kg PV (43). A PB varia sempre acima dos 16% e a MSD acima dos 70%. Menos favoráveis só mesmo os valores da MS que se situam sempre abaixo dos 17% o que é um factor de perturbação e de desregulação dos trânsitos digestivos, com implicações nutritivas desfavoráveis.
Sobre os valores da fase primaveril, constata-se a rápida diminuição de qualidade, nomeadamente através do grande acréscimo da fracção fibrosa (ADF) originando decréscimos médios da MSD de 0,28 unidades/dia, entre meados de Abril e meados de Julho. Também a PB decresce de 16% para 6%, neste mesmo período. É a fase de reforço do “esqueleto” lenhino-celulósico das herbáceas e de concentração de metabolitos glucídicos e proteicos nas sementes, empobrecendo todos os restantes órgãos da planta.
E as sementes, nestas herbáceas, não contribuem quase nada para compensar o empobrecimento nutritivo global, como acontece com as sementes gradas de outras espécies forrageiras. Elas são aqui vitais, mas só para assegurar a continuidade das espécies.
Sobre a qualidade do pasto seco estival ela é evidente, pela tendência das curvas a partir de Julho. Com a fracção fibrosa (ADF) a atingir 50% da MS, (muito devido ás perdas de folhas!), só pode resultar em decréscimos de digestibilidade até menos de 40%. A PB desce aos 5% em pastos mistos, ou a menos no caso de não haver leguminosas, tornando-se no macronutriente mais limitante da dieta.
Para este baixo valor do pasto estival muito contribuem os baixos valores das principais infestantes destas pastagens, nomeadamente nas pastagens naturais, como se pode constatar no Quadro 2.1. Na primavera, quando ainda revelam um médio valor nutritivo, são mal ingeridas por abundância de outras mais palatáveis contribuindo, assim, para pastos secos mais “enriquecidos” nestas espécies. As consequências são pastos estivais de menor ingestão voluntária e mais empobrecidos nutritivamente.
Quadro 2.1. Valores nutritivos de 4 das mais comuns infestantes das pastagens do Alentejo, na primavera (Abril) e no verão (Julho).
Parâmetros analisados | MARGAÇA (Chamaemelum) Abril Julho | PAMPILHO (Chrysantemum) Abril Julho | SARAMAGO (Raphanus) Abril Julho | SOAGEM (Echium) Abril Julho | ||||
MS (g/kg MV) PB (g/kg MS) ADF » MSD » | 170 90 380 610 | 970 40 550 330 | 170 120 350 620 | 940 50 580 320 | 190 90 410 570 | 920 40 620 320 | 170 120 400 610 | 890 60 530 310 |
Serrano, 1995 (valores não publicados)
É por isto que estes pastos estivais originam, nos rebanhos alentejanos em geral, as tradicionais perdas de peso vivo dos animais. Ou seja, o valor nutritivo destes pastos, mesmo que abundantes, traduzem-se na prática pelos conhecidos decréscimo de condição corporal dos animais, caso não sejam suplementados.
Na Fig. 2.12 mostra-se, na escala de 0 ─ 5 de condição corporal, a evolução mais comum das suas reservas lipídicas, na primavera e no verão, quando deixados só nestas pastagem. Atinge-se a melhor condição corporal em Maio-Junho (3 ─ 4) seguindo-se um período estival com perdas continuadas de peso até ao Outono. Os valores corporais decaem até ao nível 2, ou mesmo menos no caso de animais em amamentação. No capítulo 5 voltaremos a este assunto.
Em síntese, esta é a evolução nutritiva normal das nossas pastagens de sequeiro, no Alentejo. Compete ao agricultor saber explorá-las, de maneira a constituírem dietas da melhor qualidade nutritiva possível, em especial nos períodos da primavera-verão. Na primavera, fazendo pastoreios atempados e com cargas devidas, pondo, metaforicamente, “os animais a correr atrás da erva” antes que ela se degrade. E no verão, começando a complementar atempadamente os poucos pastos secos com outras forragens, nomeadamente mais ricas em fontes azotadas e, preferencialmente, proteicas.
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